“Ele disse, portanto: ‘Certo homem de nobre estirpe viajou para um país distante, para assegurar-se poder régio e voltar.’” – Lucas 19:12.
A passagem acima é apenas uma das muitas ilustrações em que Jesus falou sobre seu Reino. Jesus, representado pelo “de nobre estirpe”, retornou ao céu (o “país distante”) em 33 EC, a fim de receber o Reino (“assegurar-se poder régio”), para depois retornar, não como humano, mas como poderoso ser espiritual, executando o julgamento divino sobre os maus e salvando os fiéis a Deus, seu Pai. – Veja 2 Tessalonicenses 1:6-9.
Em função disso, as religiões nominalmente cristãs aguardam a volta de Cristo. Mas, antes de sua volta, ele adquire “poder régio”. Quando isso ocorre?[1]
Revelação (Apocalipse) 11:15 e 17 relaciona o início do Reino com a revolta das nações mundiais
“E o sétimo anjo tocou a sua trombeta. E houve vozes altas no céu, dizendo: “O reino do mundo tornou-se o reino de nosso Senhor [Jeová] e do seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre.” – Re 11:15
“Agradecemos-te, Jeová Deus, o Todo-poderoso, Aquele que é e que era, porque assumiste o teu grande poder e começaste a reinar. Mas as nações ficaram furiosas.” – Re 11:17, 18a.
Quando a História registrou ocorrências turbulentas entre as nações a nível mundial? No ano 33 EC, quando Jesus subiu ao céu? Não. O grande evento que marcou a fúria das nações foi a Primeira Guerra Mundial. Note o que os historiadores dizem sobre isso[2]:
“Desde 1914, todos os que estão cônscios das tendências do mundo estão profundamente preocupados com o que está parecendo uma marcha fadada e predeterminada em direção a uma calamidade cada vez maior. Muitas pessoas ponderadas passaram a achar que nada pode ser feito para impedir o mergulho em direção à ruína.” — Bertrand Russell, The New York Times Magazine, 27 de setembro de 1953.
“A era moderna . . . começou em 1914, e ninguém sabe quando ou como terminará. . . . Poderia terminar em aniquilamento em massa.” — The Seattle Times, 1.° de janeiro de 1959.
“O mundo inteiro realmente explodiu por volta da Primeira Guerra Mundial, e nós ainda não sabemos por quê. . . . A utopia estava à vista. Havia paz e prosperidade. Daí, tudo foi pelos ares. Desde então estamos num estado de animação suspensa.” — Dr. Walker Percy, American Medical News, 21 de novembro de 1977.
“Em 1914, o mundo perdeu a coerência que nunca mais conseguiu recuperar desde então. . . . Este tem sido um tempo de extraordinária desordem e violência, tanto fora das fronteiras nacionais como dentro delas.” — The Economist, Londres, 4 de agosto de 1979.
“Tudo ficaria cada vez melhor. Este era o mundo em que eu nasci. . . . De repente, inesperadamente, certa manhã de 1914, o negócio inteiro acabou.” — Harold Macmillan, estadista inglês, The New York Times, 23 de novembro de 1980.
Revelação capítulo 12 associa o início do Reino com a expulsão de Satanás e de seus demônios do céu
“E viu-se um grande sinal no céu, uma mulher vestida do sol e tendo a lua debaixo dos seus pés, e na sua cabeça havia uma coroa de doze estrelas, e ela estava grávida. E ela clama nas suas dores e na sua agonia de dar à luz.
“E viu-se outro sinal no céu, e eis um grande dragão cor de fogo, com sete cabeças e dez chifres, e nas suas cabeças sete diademas; e a sua cauda arrasta um terço das estrelas do céu, e as lançou para baixo à terra. E o dragão ficou parado diante da mulher, que estava para dar à luz, para que, quando desse à luz, pudesse devorar-lhe o filho.
“E ela deu à luz um filho, um varão, que há de pastorear todas as nações com vara de ferro. E o filho dela foi arrebatado para Deus e para o seu trono.”
O que significam tais simbolismos?
O “grande dragão” é Satanás, o Diabo. – Re 12:9.
Mas quem ou o que é o ‘filho varão’? Jesus? Não. Pois, assim que nasceu, tal “filho” “foi arrebatado para Deus e para o seu trono”. Todavia, Jesus não foi para o céu e nem começou a reinar assim que nasceu. Jesus somente foi arrebatado para o céu após 33 anos e meio de vida aqui na Terra. – Atos 1:9-11.
Uma vez que o filho foi arrebatado para Deus, isso significa que é filho Dele. Assim, a mulher representa Sua simbólica esposa. (Gál 4:31; Is 54:1) O filho é o Reino. Como sabemos disso?
Por ocasião do “nascimento” desse “filho” houve guerra no céu: o arcanjo Miguel e seus anjos batalharam contra Satanás e os anjos deste. Satanás e seus demônios perderam a guerra e foram expulsos do céu. – Re 12:7-9.
Após isso, proclamou-se no céu:
“Agora se realizou a salvação, e o poder, e o reino de nosso Deus, e a autoridade do seu Cristo, porque foi lançado para baixo o acusador dos nossos irmãos, o qual os acusa dia e noite perante o nosso Deus! E eles o venceram por causa do sangue do Cordeiro e por causa da palavra do seu testemunho, e não amaram as suas almas, nem mesmo ao encararem a morte.” – Re 12:10, 11.
O verbo grego traduzido por “se realizou” é gínomai.
γίνομαι [gínomai] = 1) vir à existência, começam a ser; 2) tornar-se, acontecer(referente a eventos) 3) surgir, aparecer na história; 4) ser feito.
“Vir à existência”. (Primeira definição).
– The New Annalytical Greek Lexicon, de Wesley J. Perschbacher, 1990, Massachussetts;
– The Annalytical Greek Lexicon, de Samuel Bagster e filhos, Nova Iorque, 1870.
Mas, quando a Bíblia declara “agora se realizou … o reino”, significa que foi imediatamente após a expulsão de Satanás e de seus demônios do céu? O reino não havia “nascido”, ou vindo a existir, antes dessa expulsão? Sim, e isso se torna claro com o entendimento correto da palavra grega arti (agora):
Ἄρτι = no momento atual, perto dele ou depois; agora, na presente conjuntura; imediatamente, atualmente; só agora, recentemente. – The New Annalytical Greek Lexicon, de Wesley J. Perschbacher, 1990, Massachussetts; The Annalytical Greek Lexicon, de Samuel Bagster e filhos, Nova Iorque, 1870.
As palavras em negrito mostram que arti inclui a ideia de algo próximo no tempo passado, de algo recente. A palavra inglesa juncture, usada nos dicionários gregos citados acima, e traduzida “conjuntura”, significa “encontro de acontecimentos”. (Michaelis) Portanto, para se harmonizar com o contexto de Revelação, capítulo 12, arti tem evidentemente esse sentido. Ou seja, por ocasião do ‘nascimento’ (produção) do Reino e do subseqüente lançamento de Satanás e de seus anjos para fora do céu, “se realizou... o reino”.
O que aconteceu em seguida?
“Por esta razão, regozijai-vos, ó céus, e vós os que neles residis! Ai da terra e do mar, porque desceu a vós o Diabo, tendo grande ira, sabendo que ele tem um curto período de tempo.” – Re 12:12.
Tal expulsão não ocorreu antes dos dias de Noé, uma vez que os anjos se rebelaram naquele tempo, e não antes disso. (Gn 6:1-5; Ju 6, 7) Também não ocorreu antes dos dias de Jó, visto que naquela época Satanás tinha acesso ao céu. (Jó 1:6-12; 2:1-7) Será que ocorreu no primeiro século, após Jesus ter subido ao céu? Não.
A respeito de Satanás, a voz do céu o chama de “o acusador dos nossos irmãos” e diz a respeito desses: “Eles o venceram [isto é, a Satanás] por causa do sangue do Cordeiro e por causa da palavra do seu testemunho, e não amaram as suas almas, nem mesmo ao encararem a morte.” – Re 12:10, 11.
Essa descrição dos seguidores de Jesus não se ajusta ao ano 33 EC, quando Jesus subiu ao céu. Muito pelo contrário: seus seguidores mais próximos ficaram com medo e o abandonaram. (Mt 26:55, 56) É óbvio que o texto se refere a um período de tempo posterior, quando muitos discípulos de Cristo teriam a oportunidade de demonstrar fé mesmo em face da morte.
Outra coisa: a expressão “ai da terra e do mar” evidentemente teria de marcar uma drástica mudança na Terra. O próprio livro de Revelação menciona os cavaleiros do Apocalipse, que causam profundas mudanças na Terra. Note a sequência dos acontecimentos:
1.º cavaleiro: “Saiu vencendo e para completar a sua vitória.” – Re 6:1.
2.º cavaleiro: “Foi [-lhe] concedido tirar da terra a paz.” – Re 6:4.
3.º cavaleiro: “Tinha uma balança na mão.” – Re 6:5.
4.º cavaleiro: “Tinha o nome de Morte. E o Hades [sepultura comum da humanidade] seguia-o de perto.” – Re 6:8.
Vemos uma sequência de guerra MUNDIAL (a paz foi tirada “da terra”), fome, e mortes decorrentes delas, incluindo “praga mortífera”. (Re 6:8) Foi exatamente isso o que a História registrou nos primórdios do século vinte! A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) envolveu 93 por cento da população mundial e causou enorme destruição de mantimentos, o que resultou em muita escassez de alimentos. Com a desnutrição e abalo causado pela guerra, vieram as doenças, a mais notável da época sendo a gripe espanhola, que ceifou mais de 20 milhões de pessoas em apenas poucos meses de 1918-19.
Tudo isso se harmoniza com o texto de Revelação 11:15 e 17, e 12:12, já considerados.
E o argumento de ‘sentar-se no trono’?
O entendimento equivocado de alguns, de que Jesus começou a reinar assim que subiu ao céu, deriva-se da conclusão, igualmente equivocada, de que assentar-se ele ao lado de Deus assim que subiu ao céu significaria começar a reinar.
Baseiam-se no texto abaixo:
“E Salomão começou a sentar-se no trono de Jeová como rei em lugar de Davi, seu pai.” (1 Crônicas 29:23)
Visto que a expressão ‘sentar-se no trono’ nesse texto se refere ao início do reinado de Salomão, eles entendem que, quando Jesus se sentou à direita de Deus no céu, ele (Cristo) começou a reinar. No entanto, tal conclusão não se baseia no contexto bíblico como um todo, como vimos, tendo em vista as provas demonstradas acima de que Cristo não começou a reinar em 33 EC. Também não se baseia no que a Bíblia diz acerca da expressão ‘sentar-se no trono’.
Vejamos apenas dois exemplos:
“Quando o Filho do homem chegar na sua glória, e com ele todos os anjos, então se assentará no seu trono glorioso. E diante dele serão ajuntadas todas as nações, e ele separará uns dos outros assim como o pastor separa as ovelhas dos cabritos.” – Mt 25:31, 32.
Se assentar-se no trono significa unicamente começar a reinar e se Jesus começou a reinar em 33 EC, então tal separação de ovelhas e cabritos e tal julgamento já teriam acontecido naquele tempo. Mas isso não tem lógica nem é bíblico. Não tem lógica porque muitas pessoas nasceram após o ano 33 EC. Essas não serão julgadas? E não é bíblico porque tal julgamento está no final da grande profecia de Jesus sobre a “terminação do sistema de coisas”, isto é, sobre o tempo do fim. – Mt capítulos 24 e 25.
“Na recriação, quando o Filho do homem se assentar no seu glorioso trono, vós, os que me seguistes, também estareis sentados em doze tronos, julgando as doze tribos de Israel.” – Mt 19:28.
Tal “recriação” será após o fim deste sistema de coisas. Significa então que Cristo só começará a reinar depois do fim do sistema? Tal conclusão conflitaria com os textos de Revelação que indicam que Cristo começa a reinar ainda neste sistema.
Fica claro que não podemos entender entronização, ou tornar-se rei, toda vez que lemos a expressão ‘sentar no trono’. Depende do contexto. E o contexto bíblico somado à História evidencia que Cristo começou a reinar no Reino messiânico no século 20, por volta do período da Primeira Guerra Mundial[3].
Referências:
[1] Um artigo anterior, sob o título “Jesus começou a reinar desde que subiu ao céu”, considerou matéria pertinente.
[2] As cinco citações de historiadores foi extraída da revista Despertai!, de 22 de março de 1993 (p. 11), períódico publicado pelas Testemunhas de Jeová.
[3] Veja os artigos “Tempos dos gentios” – quando começam e quando terminam? (Partes 1 e 2), neste blog.
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