Quanto ao argumento muito
usado pelos trinitaristas em João 8:58 quanto ao ‘Sou’ (Eimí), de que conjugado
nesse tempo presente indica “tempo absoluto”, “existência absoluta”, sem início
ou fim (eterna): Seria o caso de textos como Apocalipse 17:10, 11 servirem como
contra-argumento, ao dizer que um dos reis “É” (‘Roma é’, querendo dizer que
ela existe) sem com isso indicar que duraria para todo o sempre? – Pergunta de um leitor.
Resposta:
O
tempo presente no grego indica uma ação continuada (“estar fazendo”). Assim, ego
eimí tem a ideia de “eu estou sendo”, no sentido de “estou existindo”.
No caso em questão (João 8:58), não poderia indicar “existência absoluta”, “sem
início ou fim (eterna)”, visto que as palavras de Cristo estabelecem um
referencial temporal: “Antes de Abraão vir à existência” (πρὶν ᾿Αβραὰμ γενέσθαι; prìn Abraám
genésthai).
O texto que você citou – Apocalipse
17:10 – mostra que o verbo eimí (“ser”, “estar”) não tem
forçosamente um sentido absoluto. Falando de Roma, a potência mundial existente
na época da escrita do livro de Apocalipse, o texto diz: “Um é (εἷς ἔστιν; heis estin).” Evidentemente, a existência
daquela potência não seria eterna – teve um começo e teve um fim.
Quanto à essência de sua
pergunta: “Em geral textos que falam ‘ele é’, ‘que é’, ‘aquele que é’, ‘eles
são’, ‘nós somos’, ‘vós sois’ etc., são o mesmo caso de textos que usam ‘eu
sou’ [ego eimí] só mudando a pessoa [eu, tu, ele, nós, vós,
eles, elas]?” A resposta é Sim.
Você perguntou sobre
textos que usam eimí no sentido de “existir”, mas que não
indicam eternidade. Um deles é o que você mesmo citou – Apocalipse 17:10. Outro
que você poderia usar é Romanos 4:17, que descreve Deus como aquele que “chama
as coisas que não são [não existem] como se fossem” (καλοῦντος τὰ μὴ ὄντα ὡς ὄντα; kaloûntos tà mè ónta hos ónta.). “Onta” (literalmente “sendo”) é
particípio presente de eimí. O contexto diz respeito a Jeová “chamar
Abrão de ‘Abraão’, que significa ‘Pai Duma Multidão’, enquanto ele ainda não
tinha filhos”[1]. Embora
ainda não “sendo” (onta) – ou não existindo como “pai duma multidão”,
Abraão foi chamado como “sendo” (onta) – ou como existindo
como tal. Obviamente, tal existência nesse aspecto teve um princípio.
Por outro lado,
encontramos uso de eimí no sentido de existência eterna em
Hebreus 11:6, que diz a respeito de Jeová: “ele existe” (ἔστιν). Também, temos o texto de Apocalipse 1:8, na expressão ““Aquele
que é” (ὁ ὢν; ho on). “On” (literalmente “sendo”) é particípio
presente de eimí, no sentido de “Aquele que existe”. A continuação
do texto diz: “E que era” (ὁ ἦν; ho én). Note que neste caso não se estabelece um
referencial com relação à existência passada de Jeová Deus. Ele simplesmente “era”
desde a eternidade. (Sal. 90:2) Em contraste, usa-se a mesma forma verbal em
João 1;1, indicando que o Lógos (que se tornou Jesus Cristo) “era” (existia) ”NO PRINCÍPIO” (Ἐν ἀρχῇ; em arkhé). Veja que, no caso do Lógos (“Verbo”, ou “Palavra”),
a Bíblia aponta um limite no tempo: o princípio.
Assim, por se ancorarem
numa doutrina inexistente na Bíblia, os trinitaristas buscam argumentação sem
base gramatical e sem base doutrinal. A famosa frase de Jesus em João 8:58
simplesmente significa que, antes de Abraão ter existido, Jesus – como o Lógos –
já existia. Pois, como diz João 1:1 e 2, a Palavra (Lógos) existia “no
princípio” – quer dizer, ela teve um princípio, conforme mostram outros textos
bíblicos.
Nota:
[1] Obra “Estudo Perspicaz das Escrituras” (vol. 2, p. 507), publicada pelas Testemunhas de Jeová.
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