Um
leitor enviou a seguinte mensagem:
Boa noite, irmão apologista! Já faz tempo que acompanho o
seu site, e sei que você entende bem do grego. Navegando pela internet, me
deparei com um blog, onde o autor declara o seguinte: “Tau é a designação grega
da letra T. E o T assemelha-se à cruz. Há até um tipo de cruz exatamente com
essa forma. A forma de um T ou, no grego, de um TAU. O verbo sTAUrôo, etimologicamente
significa “colocar num TAU” (isto é, num T). A palavra ‘tau’ está dentro de
staurós e staurôo. Daí o sentido de crucificar.”
Tem base isso que o autor do blog declarou?
Agradeço desde já! Que Jeová o abençoe!
Resposta:
Prezado
leitor:
Os
defensores da aparência cruciforme do instrumento de execução de Jesus usam
argumentos mirabolantes, falaciosos, desconsiderando toda a evidência
disponível – textual, histórica e anatômica.
Quanto
ao argumento do autor desse texto que você citou, vários fatores são deixados
de lado:
1)
É difícil determinar a
etimologia de uma palavra.
Exemplo: a palavra “religião” vem do latim, e há quem
defenda que sua origem está em religare
(‘religar’ a pessoa com Deus), ao passo que outra corrente associa a origem a religere (“reler”), mostrando a ênfase
na pesquisa de doutrinas.
2)
Uma palavra muda de
sentido com o passar do tempo.
Mesmo quando se conhece o uso original de uma palavra, é
necessário examiná-la no contexto histórico em que ela está sendo usada.
Exemplo: A palavra “enfezado” originalmente significava “cheio de fezes”. Hoje
tem o sentido de “irritado”. Assim, mesmo que o sentido original de staurós fosse o alegado, é necessário
ver o uso dessa palavra no contexto histórico do seu uso bíblico.
3)
No uso bíblico, staurós
se equipara a xýlon.
E xýlon é usada no
“Velho Testamento” na Septuaginta (LXX)
como sendo apenas um pedaço (não dois) de madeira – um poste ou viga, em Esdras
6:11:
καὶ ἀπ᾽ ἐμοῦ ἐτέθη γνώμη ὅτι πᾶς ἄνθρωπος,
Kaì ap’ emoû etéthe gnóme hóti pãs
ánthropos,
E por mim foi dada uma ordem que todo homem
ὃς ἀλλάξει τὸ ῥῆμα τοῦτο,
καθαιρεθήσεται
hòs alláxei tò rêma toûto, kathairethésetai
que violar este decreto, seja arrancado
ξύλον ἐκ τῆς οἰκίας αὐτοῦ καὶ ὠρθωμένος
xýlon ek tês oikías autoû kaì orthoménos
um madeiro da sua casa e tendo sido
παγήσεται ἐπ᾽ αὐτοῦ, καὶ ὁ οἶκος αὐτοῦ τὸ κατ᾽ ἐμὲ ποιηθήσεται.
pagésetai ep’ autoû, kaì ho oíkos autoû to
kat’ emè poiethésetai.
pregado nele, e a casa dele se tornará confiscada.
“E um decreto
foi feito por mim, para que todo homem que alterar esta palavra, um madeiro
seja arrancado de sua casa e que ele seja levantado e morto sobre ele, e a sua
casa seja confiscada.”[1]
4)
Não há prova contrária ao uso de staurós como “estaca” tanto no grego clássico como no grego
bíblico.
A Tradução do Novo
Mundo das Escrituras Sagradas, seção 5C “Estaca de tortura”, página 1.517, explicou:
No grego clássico, a palavra stau·rós significava apenas
estaca ou poste vertical, ou estaca de fundação. O verbo stau·ró·o
significava cercar com estacas para formar uma estacada ou paliçada. Os
escritores inspirados das Escrituras Gregas Cristãs escreveram no grego comum (koi·né)
e usaram a palavra stau·rós para se referir à mesma coisa que no
grego clássico, a saber, a uma simples estaca ou poste, sem trave de qualquer
espécie ou em qualquer ângulo. Não há prova ao contrário.
Ou seja: Visto que o sentido corrente do substantivo staurós e do verbo staurôo tinha que ver, respectivamente, com “estaca” e “pregar na
estaca”, teria que haver na Bíblia uma prova de MUDANÇA de sentido, caso houvesse tal mudança. Mas não há. Segue-se,
logicamente, que o sentido clássico continuou no grego coiné.
5)
O contexto histórico bíblico mostra que Jesus morreu de
acordo com a Lei mosaica, para cumprir tal Lei.
E a forma de execução dessa Lei não era de crucificar
alguém, e sim pendurar o cadáver num madeiro (árvore), ou tronco, tendo em
vista que o sentido de “madeiro” (xúlon)
é estaca. (Esdras 6:11)
Deuteronômio 21:22, 23:
Εὰν δὲ γένηται ἔν τινι ἁμαρτία κρίμα θανάτου καὶ ἀποθάνῃ καὶ κρεμάσητε αὐτὸν ἐπὶ ξύλου, οὐκ ἐπικοιμηθήσεται τὸ σῶμα αὐτοῦ ἐπὶ τοῦ ξύλου, ἀλλὰ ταφῇ θάψετε αὐτὸν ἐν τῇ ἡμέρᾳ ἐκείνῃ, ὅτι κεκατηραμένος ὑπὸ θεοῦ πᾶς κρεμάμενος ἐπὶ ξύλου· καὶ οὐ μιανεῖτε τὴν γῆν, ἣν κύριος ὁ θεός σου δίδωσίν σοι ἐν κλήρῳ.
Eàn dè génetai én tini hamartía kríma thanátou kaì apothánei kaì
kremásete autòn epì xýlou, ouk epikoimethésetai tò soma autoû epì toû xýlou,
allà tafêi thápsete autòn en têi hemérai ekeínei, hóti kekateraménos hypò theoû pãs kremámenos epì xýlou. kaì ou mianeîte
tèn gên, hen kýrios ho theós sou dídosín soi em kléroi.
“Se um homem cometer um pecado
que mereça a sentença de morte e for morto, e você o pendurar num madeiro, seu cadáver não deve ficar a noite toda no madeiro. Você deve se certificar de
enterrá-lo naquele dia, pois quem é pendurado
num madeiro é amaldiçoado por Deus. Você não deve tornar impura a terra que
Jeová, seu Deus, lhe dá como herança.”
6)
Os dicionários das línguas antigas reconhecem que staurós
significa “estaca” e que a crux
inicialmente também tinha o sentido de um poste ou viga.
Veja
a Tradução do Novo Mundo das Escrituras
Sagradas, no tópico 5C “Estaca de tortura” Gr.: σταυρός (stau·rós); lat.:
crux, p. 1517:
O dicionário latino de Lewis e Short apresenta o
sentido básico de crux como “uma árvore, armação ou outro
instrumento de execução feito de madeira em que se pregavam ou penduravam
criminosos”. Nos escritos de Lívio, historiador romano do primeiro século AEC, crux
significa apenas uma estaca. “Cruz” é apenas um significado posterior de crux.
Uma simples estaca para se fixar nela um criminoso era chamada em latim de crux
sím·plex. Tal instrumento de tortura foi ilustrado por Justo Lipsio
(1547-1606) no seu livro De cruce libri tres, Antuérpia, 1629,
p. 19. A fotografia da crux simplex na nossa p. 1518 é uma
reprodução exata tirada de seu livro.
Você
poderá ler matéria adicional sobre a forma do instrumento de execução de Jesus
nestes artigos:
Espero
que os comentários acima possam lhe ter sido de ajuda.
Grande
abraço e fique com Jeová.
Após
isso, o mesmo leitor contribuiu com informação adicional sobre o provável
sentido de staurôo:
Também, acabou de chegar um livro que comprei na
internet que se chama “A cruz universal”, e na pg. 65 diz:
“Stauros provém de st(h)au, de onde derivam “instaurar”
e “restaurar”. Em grego, como em latim, a palavra que significa, hoje, cruz
referia-se primitivamente a uma peça vertical de madeira, em particular aquela
que seria para imobilizar um supliciado. (Encontra-se hoje essa acepção da
palavra “cruz” no verbo inglês to
excruciate, que significa “torturar”, submeter ao suplício). Por
consequência, a ideia moderna de “cruzamento”, “encruzilhada” está ausente dos
termos fundamentais crux e staurós.”
O opositor não citou nenhuma fonte para sustentar
as informações dele. Portanto, não tem base alguma!
Um grande abraço para o irmão também!
Seguem as fotos disponibilizadas gentilmente
pelo leitor da obra por ele supracitada:
Nota:
[1] Disponível em:
https://bibliaonlinesnt.blogspot.com.br/2016/11/septuaginta-esdras-capitulo-6_5.html
A
menos que haja uma indicação, todas as citações bíblicas são da Tradução do
Novo Mundo da Bíblia Sagrada, publicada
pelas Testemunhas de Jeová.
Contato: oapologistadaverdade@gmail.com
Os artigos deste site podem ser citados ou republicados, desde que seja citada a
fonte: o site www.oapologistadaverdade.org
Comentários
Da mesma forma, a peça de execução onde foi pendurado Jesus pode muito bem ter tido uma peça auxiliar no topo para o suporte das mãos, mas isso não impede que ainda seja chamada de estaca, pois seja o T ou o I ambos são apenas uma peça fincada no chão. O que pode ter sido usado no topo para o suporte das mãos é apenas um acessório. Inclusive se lembrarmos da PLACA que foi colocada acima da cabeça de Jesus, essa placa forma um T com o poste principal, queira ou não! E essa imagem inicial do poste com a placa acima da cabeça de Jesus pode muito bem ter sido o que foi transmitido com o passar dos séculos. Portanto, o formato da cruz pode sim ter sido um T ou uma estaca I. Só o significado básico da palavra Stauros não ajuda em nada para se bater o martelo e se concluir sem sombra de dúvidas. Todas as informações que a bíblia nós dá devem ser consideradas na nossa análise.
O relato inspirado nos diz que:
1. Cada mão de Jesus foi perfurada COM UM PREGO EM CADA MÃO, como nos diz a fala de Tomé. Mas essa informação não nos permite definir se as mãos foram pregadas na mesma estaca que os pés ou se foram pregadas em uma peça de madeira separada.
2. A bíblia diz que Pilatos colocou uma placa com dizeres ACIMA DA CABEÇA DE JESUS, o que pode nos levar a concluir que acima da cabeça de Jesus havia em espaço LIVRE da estaca onde foi pregada a placa, o que nos permite concluir que as mãos de Jesus NÃO ocupavam o espaço acima de sua cabeça, mas TALVEZ FORAM PREGADAS SEPARADAS. Mas essa informação pode ser tanto aplicada a uma pessoa pregada numa Cruz "T" QUANTO numa estaca I.
Resumindo: Tanto Cruz T quanto Cruz I tem as suas defesas...O que não podemos é fazer disso um assunto que "revelaria" a religião que ensina a doutrina Verdadeira! Isso deve ser tratado apenas como uma CURIOSIDADE HISTÓRICA.
Embora tal tema não tenha relevância como doutrinas fundamentais, a saber, a identidade de Deus e de Jesus Cristo, a justiça de Deus aplicada na salvação e na destruição de pessoas, a condição dos mortos etc., não se trata de mera curiosidade histórica porque a cristandade fez da cruz não apenas o instrumento de suplício de Cristo como também um objeto de adoração, violando assim o preceito cristão contra a idolatria. – 1 Coríntios 10:14.
A idolatria da cruz é tão mais errada do que seu formato que basta pensarmos no seguinte: digamos que desde sempre se soubesse que a cruz onde Jesus foi morto fosse apenas uma estaca. Mas com o tempo as igrejas adoracem um poste no lugar de uma cruz. Estaria errado do lesmo jeito, pois ainda seria idolatria!
...eu acredito que aquilo que a organização de Jeová ensina é o conjunto da verdade baseada na palavra de Deus."
Pergunto:
Mesmo com todos os ajustes feitos ao longo da história dos Estudantes da Bìblia e das TJ?